A T R E V E S - T E A E S C R E V E R ? #3 ( um conto )

 


( gatilhos: menção de sangue, menção de morte. )

Já é tarde demais. Eles querem vingança. Não tenho escolha senão fugir. 

 
O meu coração batia freneticamente dentro do meu peito enquanto me movimentava rapidamente de uma divisão para a outra, procurando por tudo o que era importante para levar comigo. Estava a ficar sem tempo, a cada tique do relógio, a cada segundo que ele marca a passar. Pequenas gotículas de suor escorreram lentamente pela minha têmpora abaixo, enquanto a minha mente acelerava de todas as vezes que os meus pulmões se encontravam preenchidos com uma golfada de ar. O mesmo era tão sufocante, quase como se respirar fosse uma tarefa e não um gesto que necessitava para sobreviver todos os dias, algo tão natural como caminhar, abrir os olhos ou até falar. Fazia parte do nosso ser e ainda assim, o meu peito encontrava-se apertado - era difícil de respirar. Tinha de manter a calma, precisava de reunir as minhas posses e sair daqui o mais rápido possível.  


O medo preenchia o meu coração, aterrorizava até a minha alma, sempre que olhava para o chão aos meus pés e via o sangue. O mesmo que pertencia a alguém que entrou em minha casa e livrar o Mundo da minha presença.  
Eram três da manhã, a noite ainda era jovem, porém eu sentia como já tivesse acordada há mais de vinte e quatro horas. Os meus olhos, tão pesados, mal conseguiam fazer um esforço para se manterem abertos. Mas não podia sequer pensar em adormecer agora, não podia pensar em descansar ou até considerar a possibilidade... não quando um deles estava morto. No meu apartamento.  
Aos meus pés.  


Tinha receio de olhar, o medo que me preenchia a alma não permitia que olhasse naquela direção e permitisse que o que eu fiz, se afundasse dentro de mim.  
Foi autodefesa, eu continuava a dizer para mim própria. 
Algo me dizia que a polícia não iria acreditar em mim, especialmente quando eu sabia que o meu Passado iria acabar por ser revelado e eu seria atirada para a prisão... ou pior.  

Resumindo o que estava a fazer antes de me perder nos meus pensamentos, ou até me focar no corpo do homem no canto do meu quarto pequeno, atirei os meus documentos para dentro da mala de viagem, juntamente com algumas roupas e a minha câmara fotográfica.  
Respirei fundo enquanto fechava a mala, fechei os olhos por um momento e tentei acalmar-me. Eu ia fugir para outro país se fosse necessário, eles nunca iriam parar de me seguir, não enquanto eu não pagasse por cometer este ato horrível e mórbido contra um deles.  

Olhei uma última vez para o corpo, os olhos do homem agora despidos de qualquer vida assim como o seu corpo inanimado, uma pessoa que me era desconhecida. Alguém que se deu ao esforço de ser silencioso e tentar cometer um crime horrível.  


Eu escapei com a minha vida.  


Mas não sem as cicatrizes que me iam marcar para o resto da minha vida.  

Antes de passar pelo corpo a correr, verificando como a faca ainda se encontrava ainda enterrada no seu pescoço, abandonei a divisão e ajustei o a alça da mala na minha mão. Eu não tinha muito, não necessitava de tantos bens materiais e isso apenas tornara a minha vida mais fácil neste momento.  

Eu sabia que mais cedo ou mais tarde eles iam encontrar-me.  
Devia estar morta e esse conhecimento quase que me assombrava. Eles tiraram-me das ruas quando eu mais precisei de ajuda, deram-me comida e abrigo também... em troca de favores. Os mesmos, podiam ser o que eles quisessem e eu não podia discutir de volta ou negar. Estava em dívida para com eles e talvez tenham decidido que a minha vida pagaria a dívida.  


Agora com um dos homens deles morto, os meus dias estavam contados e se não escapasse, não haveria mais nenhum nascer do sol a cumprimentar-me nas madrugadas em que eu não conseguia dormir.  

As ruas estavam vazias e a partir do momento em que abandonei o prédio, o frio atingiu-me o rosto como uma bofetada sem mão. Os meus olhos encheram-se de lágrimas, o choque a apoderar-se de mim como uma doença a espalhar-se. A minha respiração acelerou, juntamente com os meus passos e o meu coração a bater freneticamente dentro do meu peito.  
Se eu conseguisse chegar à loja de alugueres de vídeos no centro da cidade, segura e sã, conseguiria ter uma escapatória desta cidade e abandonar a minha vida antiga. Podia ir para qualquer lado, ter uma identidade nova, pintar o meu cabelo loiro de preto e até usar lentes de contato. Talvez até começar a usar maquilhagem para que ninguém me reconhecesse ou até percebesse que me viu na rua às três e dez da manhã.  


Suspirei para mim própria, rezando a um Deus em que não acreditava, que tudo corresse bem e que conseguisse sair deste inferno de uma vez por todas. Quando escapei, sempre acreditei que eles viriam atrás de mim – afinal, se eles tinham coragem para me ordenar que roubasse as vidas de pessoas inocentes, o que faria de mim algo para eles senão uma agente que era descartável?  

Caminhei rapidamente e assim que avistei a loja, senti o alívio a preencher o meu peito. A minha mente já não se sentia tão pesada e continuava a dizer para mim própria: ‘estás segura agora, nada de mal vai acontecer. 


  • - Brad. - Murmurei o nome do homem que se encontrava no balcão.  


  • - Jade. - O seu olhar elevou-se, surpreso. - Do que precisas? 


  • - Preciso... de um DVD específico.  

 

Brad não questionou ou falou mais uma palavra. Ele indicou que eu o seguisse e assim o fiz, caminhando por uma entrada estreita e quando abandonamos o local, avistei uma carrinha escura como a noite que nos rodeava. Ele pegou em alguns documentos, entregando-mos para a mão, e apenas disse para os ver quando estivesse a caminho. 
Chegando com a minha mão no meu bolso, entregue-lhe um envelope com dinheiro e ele anuiu, virando as costas e abandonando-me para a noite sombria e um estranho que me levaria para uma vida nova.  

 

E foi assim que eu escapei com a minha vida de um grupo vicioso, para começar de novo.  
Uma página branca, num capítulo novo de um livro que iria ser escrito.  

 

N/A:

 Decidi participar também nesta semana no objetivo criativo da Elisabete Moreira & da Vera Barbosa "Atreves-te a escrever?"
O objetivo consta em escrever um conto entre 500 e 1000 palavras com um tema de suspense!
 

Eu tenho de admitir que isto foi escrito hoje, com inspiração em bastantes shows que estou a ver! Eu sei que os meus contos são todos os um bocadinho mais obscuros, mas espero que gostem na mesma! heheDeixem-me saber aqui ou no instagram ! ♡

Comentários

  1. Olá, Ruth!
    Mais uma vez, presenteias-nos com um conto incrível, com uma backstory bem definida e misteriosa, e descrições maravilhosas. Parabéns!
    Obrigada por teres participado, esperamos ver-te neste último tema!
    Um beijinho,
    Elisabete.

    ResponderEliminar
  2. Quero saber para onde ela vai e como será a sua nova vida.
    Sinto que o passado ainda a vai assombrar, ahahah.
    Gostei muito, em especial da forma como escreveste a confusão que ia na cabeça da personagem. Senti deste lado.
    Beijnhos

    ResponderEliminar

Enviar um comentário

Mensagens populares